28 jul. 2020 - Brasil, Curitiba
A partir de 1990, com a vigência da Lei dos Crimes Hediondos é que a delação premiada foi positivada (Art. 8º, parágrafo único) e começou a ganhar espaço, contudo somente com o advento da Lei 9.099/95 é que os delitos de menor potencial lesivo passaram a permitir a transação (nos delitos com pena em abstrato máxima de 2 anos).
Mendonça e Carvalho (2008) ensinam que no contexto internacional:
“A delação premiada surgiu no combate das grandes organizações criminosas ocorridas nos Estados Unidos, notadamente a Máfia e a Cosa Nostra. Era uma verdadeira transação penal firmada entre os Procuradores Federais e alguns envolvidos, que seriam beneficiados com a impunidade caso fornecessem informações suficientes que pudessem levar à desestruturação das referidas organizações e prisão de seus integrantes. Posteriormente foi utilizada com sucesso na “Operação Mãos Limpas”, na Itália, onde se conseguiu debelar grandes organizações criminosas graças ao instituto da delação premiada.”
A legislação pátria prevê que a colaboração premiada deverá ser negociada com o Ministério Público ou com a Polícia e ao Magistrado compete homologar o acordo, contudo é neste momento que é realizada análise do acordo celebrado, quanto à sua regularidade, legalidade e voluntariedade nos termos do Art. 4º, §7º da Lei 12.850/2013 e os benefícios serão concedidos definitivamente quando da prolação da sentença, onde também será avaliada a modalidade de cumprimento do acordo e a eficácia da colaboração, (MENDES, 2019).
Ainda que seja alvo de posicionamentos antagônicos, muitas vezes tida como um “mal necessário”, o instituto da delação premiada por certo tem seu lado positivo, que não se trata apenas do resultado rápido conquistado pelo Estado na resolução de crimes complexos ou a economia financeira e processual, mas o esforço dos atores e operadores do direito para o efetivo combate ao crime organizado, por isso sua aplicabilidade e alcance tem variadas nuances dentro dos diferentes diplomas legais que permitem sua aplicação, conforme o contexto em que o delator está inserido.
A exemplo da Lei 12.683/2012, ao se falar nos crimes de lavagem de dinheiro, na hipótese de o infrator colaborar de forma efetiva com a justiça, poderá ser beneficiado com redução da pena bem como pode obter a fixação do regime aberto ou semiaberto. Além disso, ao juiz é facultado, conforme o caso concreto, deixar de aplicar ou até substituir a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. Claro que estas benesses dependem de como foi oferecida a delação, se foi espontânea e se os esclarecimentos prestados colaboraram de forma efetiva para a apuração das infrações penais, se de fato outros infratores, coautores e partícipes foram localizados, além dos bens, direitos ou valores objetos do crime (Art. 1º, § 5º).
No que se refere à Lei nº 9.807/99, Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas, as consequências podem variar. São diferentes os reflexos quando se trata de réu primário ou reincidente. Quanto ao réu primário, havendo a colaboração efetiva e voluntária com a investigação durante o processo criminal, desde que haja identificação de outros agentes envolvidos no delito (se for o caso) ou ainda sendo localizada a vítima (e desde que esteja preservada sua integridade física) bem como haja a recuperação, seja total ou parcial, do produto do crime, a delação poderá ensejar até o perdão judicial e como consequência benéfica final, impor a extinção da punibilidade (Art. 13). De outro viés, sendo o acusado reincidente (o qual já praticou outro delito anteriormente), caso colabore nos mesmos termos acima, a delação ensejará diminuição de pena (Art. 14).
Outrossim, com estas características, a alternativa legal para se evitar a prisão, é um caminho direcionado à proteção dos direitos humanos, à garantia dos direitos fundamentais do cidadão bem como permitir que o infrator beneficiado continue no seio da sociedade sob o manto familiar, pode ser vista como uma oportunidade real para a não reincidência, entretanto, o cenário que é avaliado recentemente aponta que a “não reincidência” tem sido uma variável não identificada em oposição ao propósito (ou intensão) original da Lei.
De sorte que o instituto da delação premiada pode ser tratada como causa de diminuição de pena quando sua aplicação ocorrer no âmbito da Lei nº 8.072/90 – Lei dos Crimes Hediondos (Art. 8º, § único); Lei nº 8.137/90 – Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e contra as Relações de Consumo (Art. 16, § único); Código Penal (Art. 159, § 4º); ou ainda a Lei nº 11.343/06 – Lei Antitóxicos (Art. 41).
As diferentes naturezas das benesses que a delação premiada pode ensejar acaba por tornar um pouco dificultosa sua aplicação, contudo, não se pode deixar de se atentar ao seu propósito e seus pontos positivos, pois em qualquer dos casos, há evidente benefício ao infrator que colaborar com a justiça.
Referências
MENDONÇA, A. B. de; CARVALHO, P. R. G. de. Lei de drogas: Lei 11.343, de 23 de agosto de 2006 – comentada artigo por artigo. São Paulo: Método, 2008.
BRASIL. Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8072.htm. Acesso em: 07 agosto 2020.
_____. Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8137.htm. Acesso em: 07 agosto 2020.
_____. Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9807.htm. Acesso em: 07 agosto 2020.
_____. Lei nº 12.683, de 9 de julho de 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12683.htm. Acesso em: 07 agosto 2020.
_____. Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em: 07 agosto 2020.
MENDES, G. F. Sistema de Justiça e Colaboração Premiada: o desafio da conciliação. Revista Jurídica da Presidência, Brasília, v. 21, n. 124 jun./set. 2019 p. 240-261. Disponível em: https://revistajuridica.presidencia.gov.br/index.php/saj/article/view/2019. Acesso em: 07 agosto 2020.
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